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RISCO ELEVADO Pelos cálculos do Sebrae, 25% dos micro e pequenos negócios do País podem fechar as portas de forma definitiva. (Crédito: Domingos Peixoto )

“Molezinha” é não governar

Declarações desastrosas do ministro da Economia e do presidente da Caixa refletem uma dura realidade para o brasileiro empreendedor.

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Você percebe que um país está desgovernado quando não há política clara, razoável e civilizada para algo da gravidade de uma pandemia. Você tem certeza que um país está desgovernado quando vem a público o vídeo de uma reunião da cúpula executiva de Brasília que envergonharia um candidato a trainee. A divulgação do conteúdo daquela patuscada ministerial do dia 22 de abril evidenciou o lado sombrio de uma administração que mesmo dizendo colocar a economia como pauta principal adota movimentos claramente contrários.

O ministro Paulo Guedes afirmou que o governo “iria perder dinheiro salvando empresas pequenininhas”. O presidente da Caixa, Pedro Guimarães, regurgitou suas preocupações superiores: “Qual o grande ponto que a gente tem que evitar? O cara está quebrado, já estava quebrado antes, e quer a nossa molezinha”. Reuniões privadas de qualquer porte — em família ou numa empresa — costumam trazer verdades e transparências que expostas a público ganham amplificação desnecessária.

O ponto não é esse. Por isso, danem-se os palavrões citados. A questão é mais pragmática: os conceitos defendidos não vão salvar boa parte da economia do País. As falas de Guedes e Guimarães são um decreto de morte a uma legião de empreendedores brasileiros. Um “adeus, queridos” sem desvios. E boa parte desses condenados votou nessa equipe para comandar o País — pesquisa Ibope antes do segundo turno das eleições de 2018 mostrava que para 65% dos eleitores o governo atual defenderia interesses do setor empresarial. Não é o que se mostra.

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“O que a gente tem que evitar? O cara está quebrado, já estava quebrado antes, e quer a nossa molezinha?” Pedro Guimarães Presidente da Caixa. (Crédito:Marcello Casal Jr.)

Pedro Guimarães diz que é a favor de políticas de auxílio. “Claramente tem que ajudar, eu concordo. Agora, não é para todo mundo não.” Se a fala dele é uma retórica ou uma ordem, os fatos mostram que está mais para a segunda opção. E acertou em cheio no pequeno empresário. Levantamento do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) mostra que 86% dos micro e pequenos empresários que buscam algum tipo de crédito não obtêm resposta positiva. Entre os que buscaram ajuda em outras fontes que não bancos, 43% recorreram a parentes e amigos e 16% negociaram dívidas com fornecedores. A pesquisa foi realizada com 10.384 donos de pequenos negócios em todos os estados entre os dias 30 de abril e 5 de maio.

O governo federal fez um aceno a eles na quarta-feira 27, quando publicou a Medida Provisória 972, que destina R$ 15,9 bilhões a um fundo garantidor para os empréstimos oferecidos por meio do Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe). A linha de crédito libera, em tese, até 30% da receita bruta anual com base no exercício de 2019. Para o presidente do Sebrae nacional, Carlos Melles, falta agilidade e menos burocracia por parte dos agentes bancários. “Uma coisa é ver vontade. Outra é ver de fato o recurso chegar. O que temos visto é propaganda demais e dinheiro de menos”, diz, referindo-se não apenas à Caixa. Mas como a instituição tem liderado uma política assertiva para mexer no mercado financeiro — com reduções agressivas de juro, por exemplo — é de supor que a fala de seu presidente paute a concorrência.

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O HISTÓRICO 22 DE ABRIL Reunião que culminou na saída de Moro explicitou que comando econômico do País não pretende salvar todo mundo. (Crédito:Marcos Corrêa)

A percepção da dificuldade da chegada do dinheiro à ponta também foi detectada pelo Indicador de Facilidade de Acesso ao Crédito das Sondagens Empresariais, calculado pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV Ibre), que registrou perda de 31,8 pontos entre março e abril. O índice chegou a 56,8 pontos, o menor desde junho de 2016. Para a economista Renata de Mello Francisco, coordenadora do estudo, a recuperação econômica poderá ser mais rápida se o emprego for preservado, para que o consumo possa fazer com que a roda continue a girar.

“Se o crédito não está chegando, fica muito difícil para as empresas sobreviverem. A gente percebe intenção de ajudar da parte do governo, mas a prática não reflete essa ação”, diz. Pequenas e micro empresas respondem por 99% das empresas brasileiras. São 17 milhões de negócios que respondem por 30% do Produto Interno Bruto (PIB).

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“Uma coisa é ver vontade. Outra é o recurso chegar. O que temos visto é propaganda demais e dinheiro de menos” Carlos Melles Presidente Sebrae Nacional. (Crédito:Divulgação)
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DESEMPREGO Carlos Melles, do Sebrae, acredita que, sem uma ação rápida para dar vazão aos recursos, 25% desse contingente pode fechar as portas em definitivo no cenário pós-coronavírus. E quem vai pagar a conta? Além do pequeno e médio empresário, o trabalhador na ponta. O resultado do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) divulgado na quarta-feira 27 mostra o fechamento de 1,1 milhão de postos de trabalho com carteira assinada entre os meses de março e abril, pior resultado desde o início da série histórica, em 1992. A taxa de desemprego do País chegou a 12,2%, atingindo 12,8 milhões de pessoas, conforme os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua).

Para o professor de macroeconomia e doutor em finanças públicas pela Universidade de São Paulo (USP) Carlos Eduardo Nicoletti a perspectiva é de uma taxa de desemprego nas nuvens, na ordem de 20%. “Um aumento de oito pontos percentuais na empregabilidade é muito ruim para as contas públicas, principalmente a Previdência”, diz. O governo federal até tentou contribuir com a manutenção de postos de trabalho em tempos de crise. No começo de maio, começou a pagar o auxílio financeiro para assegurar parte do salário a empresas que aderiram à Medida Provisória 936, que possibilita a suspensão do contrato de trabalho por 60 dias e redução salarial e de jornada por 90 dias. Pela medida, a empresa arca com 30% do salário e o governo federal, até 70% do valor do seguro-desemprego a que o trabalhador teria direito em caso de demissão. O ministério da Economia colocou no Orçamento R$ 51,6 bilhões para o chamado Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e Renda, que deve chegar a 5,6 milhões de empregados até o fim do mês.

Nos primeiros sete dias de vigência, foram garantidos os recursos para 1,9 milhão de trabalhadores. O que claramente tem se mostrado insuficiente. “O tiro do auxílio para pagamento de salários saiu pela culatra. As empresas pediram e mesmo assim demitiram”, diz Nicoletti. “Teremos um contingente de desempregados e zero políticas públicas para retomada do emprego.” O que mostra que, definitivamente, pandemia e fechamento do comércio não combinam com bravata. Nem com desgoverno.