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Por que tantos lançamentos de foguetes são adiados em cima da hora?

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Quando se fala em lançamentos espaciais, o maior balde de água fria que, infelizmente, acontece com certa frequência, são cancelamentos aos 45 do segundo tempo. Foi o que aconteceu nesta quinta-feira (27), quando o mundo todo estava acompanhando, ao vivo pela internet, o que seria um lançamento histórico para a NASA e para a SpaceX, pois a empresa de Elon Musk levaria, pela primeira vez, humanos ao espaço.

Novas tentativas acabam acontecendo nos dias subsequentes, normalmente dando tudo certo depois de muita emoção. Mas por que tantos lançamentos precisam ser cancelados em cima da hora, se isso significa muita dor de cabeça e prejuízos a todos os envolvidos?

Condições climáticas

Entre os principais motivos que explicam o cancelamento de um lançamento de foguete estão as condições climáticas do momento. Afinal, se climas adversos já são suficientes para cancelar e causar atrasos em voos comerciais, que dirá em lançamentos de gigantescos (e caríssimos) foguetes, não é mesmo?

E quando se trata de lançamentos espaciais, engenheiros ficam monitorando aqui no solo uma variedade de fatores e, para os padrões da NASA, não pode haver precipitação alguma durante o lançamento. Ainda, os ventos não podem ser mais rápidos do que cerca de 33 km/h vindos do nordeste do país ou cerca de 62 km/h de outras direções.

Temperaturas abaixo dos 8,8ºC significam que haverá acúmulo de gelo no foguete ou problemas em determinados equipamentos — a explosão do ônibus espacial Challenger, em 1986, matou sete pessoas porque os anéis de borracha do foguete ficaram muito frios na plataforma de lançamento na noite anterior, por exemplo. E os tetos de nuvens não podem estar abaixo de 1,8 km de altitude. Por fim, a NASA também tem protocolos diferentes para liberar lançamentos de foguetes através de nuvens do tipo cumulus e do tipo cirrus.

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Explosão do ônibus espacial da NASA em 1986 (Foto: MICHELE MCDONALD, VIRGINIAN-PILOT/AP)

Relâmpagos também podem representar grande perigo: a NASA não abastecerá um foguete se houver mais de 20% de chance de um raio atingir a região a uma extensão de 8 km do local do lançamento, e o foguete não será lançado se um raio for observado a 16 km da trajetória de seu voo. E ainda que o clima não esteja com tempestades de raios, o cancelamento do lançamento também acontecerá se, na região onde o foguete estiver posicionado, forem avistadas nuvens que produzem raios.

Aí vem um grande problema: a região central da Flórida, justamente onde fica a sede do Kennedy Space Center e também a Estação de Cabo Canaveral (onde acontecem muitos dos lançamentos para o espaço), experimenta mais raios do que qualquer outro lugar dos Estados Unidos. Então, a NASA fica monitorando a atividade do campo elétrico local para garantir que nem uma pequena faísca cause uma catástrofe, preferindo adiar um lançamento (e arcar com o prejuízo) do que arriscar mais um desastre de proporções gigantescas.

Os dados meteorológicos são coletados até os últimos segundos antes do lançamento, até o limite para que se possa dar o comando de abortar. Depois disso, os computadores de bordo usam os dados da melhor maneira possível para determinar como levar o foguete até onde ele deve ir.

Problemas mecânicos de última hora

A complexidade da engenharia de um foguete é comparável à do corpo humano, com tudo ali sendo extremamente delicado. Um único problema mecânico, por mais simples que aparente ser, pode ameaçar a integridade de todo o foguete.

Por exemplo, algum procedimento inadequado no abastecimento pode criar uma reação volátil não intencional, que cria uma combustão — foi o que aconteceu com a SpaceX em 2016, por exemplo. Ainda, um suporte de aço defeituoso, destinado a proteger uma lata de hélio, foi a provável causa da explosão que a empresa sofreu em 2015. Muito tempo atrás, nos testes da Apollo 1, da NASA (em 1967), um incêndio aconteceu após faíscas elétricas serem liberadas em um ambiente com oxigênio puro, levando a vida dos três membros da tripulação.

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Como ficou a nave de testes da Apollo 1 após o acidente (Foto: NASA)

Existem milhares de sensores que ficam, até os últimos segundos antes de qualquer lançamento, coletando dados para ver se há qualquer coisa fora dos padrões. Caso qualquer um deles detecte uma anomalia, ou ao menos um mínimo sinal de preocupação, o sensor emite um sinal de alerta recomendando o não lançamento do veículo.

E essas medidas não visam somente proteger o foguete, suas cargas e tripulações: a segurança do pessoal em terra também está em jogo. No Brasil, em 2003, um lançamento da Agência Espacial Brasileira no Centro de Lançamento de Alcântara (MA) acabou acontecendo de maneira antecipada, durante os preparativos do lançamento, causando uma explosão que matou 21 pessoas e deixou muitos outros feridos.

Motivos bizarros

Em 2014, a NASA precisou cancelar um lançamento de cargas à Estação Espacial Internacional porque um veleiro estava sob a trajetória de voo do foguete, a cerca de 65 quilômetros do local do lançamento. Então, a agência espacial preferiu cancelar o lançamento do que arriscar destruir o barco e seus passageiros caso houvesse algum problema que causasse uma explosão, por exemplo.

Na época dos ônibus espaciais da NASA, os cancelamentos custaram algo em torno de US$ 1,2 milhão — meio milhão em perdas de combustível e outros US$ 700 mil para pagar o lançamento adicional. Ainda assim, esses gastos são um preço aceitável em comparação com o quanto seria desperdiçado caso se insistisse em um lançamento com risco de algo dar errado, causando explosões que destruiriam os equipamentos e, possivelmente, a vida das pessoas envolvidas. Então, quando o assunto são lançamentos espaciais, vale mesmo a máxima do "melhor prevenir do que remediar".

*Esta matéria foi originalmente publicada em 21/02/2018, sendo atualizada e republicada em 27/05/2020