Participação de investidores estrangeiros na dívida pública cai a menor nível em 10 anos

Estrangeiros vendem R$ 79 bilhões durante a pandemia; participação dos não residentes caiu para 9,36%

Os investidores estrangeiros se desfizeram de R$ 78,8 bilhões em títulos púbicos brasileiros em março e abril, em meio ao cenário da pandemia do coronavírus no país. Com isso, a participação dos não residentes na dívida pública interna caiu para 9,36%, a menor desde dezembro de 2009.

Os dados foram divulgados pelo Tesouro Nacional no relatório mensal da dívida pública referente ao mês de abril. Só nesse mês, houve saída líquida de R$ 24,3 bilhões de estrangeiros.

O cenário de piora nas contas públicas em meio aos efeitos da Covid-19 e às incertezas no cenário doméstico e global tem aumentado a percepção de risco de investidores em relação a ativos emergentes e, especificamente, brasileiros.

A avaliação do Tesouro é que as incertezas relacionadas tanto ao mercado doméstico como o internacional contribuíram para inibir recuos das taxas de juros mais longos em abril.

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Estrangeiros vendem R$ 79 bi na pandemia e participação na dívida pública é a menor em mais de 10 anos - Gabriel Cabral/Folhapress

O Brasil vem registrando uma percepção de risco maior que a de pares internacionais em meio à crise. O CDS (Credit Default Swap, indicador que mede o risco-país) do Brasil ficou mais alto que países monitorados pelo Tesouro tanto em abril como em maio.

O CDS brasileiro recuou 11%, para 274 pontos em maio (dados colhidos pelo Tesouro até o dia 26). O do Peru caiu 12,9%, para 89 pontos. O do Chile caiu 13,7%, para 91 pontos. O da Colômbia desceu 27,5%, para 176 pontos. E o do México se reduziu em 32,8%, para 171 pontos.

Além dos estrangeiros, também registraram saída líquida da dívida pública em abril as instituições financeiras, os fundos de investimento e até mesmo o governo. Por outro lado, elevaram o estoque de forma marginal entidades de previdência.

Na avaliação do Tesouro, expressa em comentário que acompanha o relatório, o movimento dos detentores está associado a fatores como os vencimentos do mês de abril, ao ambiente de incerteza global e à realocação de ativos dos investidores com a preferência por liquidez.

O Tesouro viu restrições nas condições de financiamento no mercado doméstico de títulos públicos em março e abril, além de uma opção dos investidores por ativos menos arriscados e mais líquidos. Com isso, o Tesouro favoreceu emissões de títulos com taxa prefixada com prazos mais curtos e os de taxa flutuante.

Apesar dos sinais gradativos de melhora ao longo do mês de maio, diz o Tesouro, as condições financeiras continuaram a se mostrar restritivas diante das incertezas relacionadas à extensão e à profundidade dos impactos adversos da pandemia de Covid-19.

Esses aspectos, afirmam os técnicos, podem repercutir também sobre questões geopolíticas internacionais e sobre a capacidade de recuperação do nível de atividade global.

A aversão dos estrangeiros aos ativos brasileiros também tem sido registrada em indicadores, como a bolsa. Dados da B3 mostram que em 2020 os não residentes tiveram venda líquida de R$ 65,6 bilhões (considerando dados até 22 de maio).

O investimento estrangeiro direto, indicador do Banco Central, caiu para US$ 234 milhões em abril, abaixo dos US$ 5,1 bi de um ano antes.

Apesar disso, o Tesouro afirma que, apesar das condições ainda bastante restritivas de liquidez, os volumes emitidos em maio mostram que as condições financeiras estariam, gradativamente, caminhando em direção à normalidade.

"Ao longo do mês de maio, o cenário globalmente ficou melhor e os volumes emitidos pelo Tesouro neste mês, até o momento, têm sido significativamente maiores. O colchão de liquidez segue em níveis confortáveis e a emissão líquida em maio contribuirá para o fortalecimento do caixa", afirma o coordenador-geral de Operações da Dívida Pública, Luis Felipe Vital Nunes Pereira.