Qual a diferença entre remake, remaster e reboot?
by Rafael ArbuluSomente neste primeiro semestre de 2020, tivemos três releituras de jogos clássicos, originalmente lançados em gerações passadas dos videogames: Final Fantasy VII Remake finalmente deu as caras no PlayStation 4, sendo infinitamente maior que seu produto original de 1997, ao passo que Resident Evil 3 foi lançado para os principais consoles com muitas atualizações, e Trials of Mana chegou ao Nintendo Switch e PS4 com visuais totalmente refeitos, mas essencialmente o mesmo jogo de 1995, quando foi eleito por muitos o título mais bonito da era 16-bit.
Isso, embora não pareça, vem confundindo a cabeça de muita gente, já que, nos anos recentes, a indústria dos videogames acostumou-se a tratar seu público com quatro nomes distintos: remake, remaster e reboot. Cada qual tem seu próprio entendimento e o emprego de cada palavra não é lá muito levado ao pé da letra, mas seus significados podem facilmente fazer você se referir a um produto quando queria falar de outro.
Então, afinal de contas, qual a diferença entre remake, remaster e reboot?
Remaster
Resumidamente, os remasters são jogos que aprimoraram aspectos visuais e sonoros de um jogo original. Em 90% dos casos, os remasters aplicam uma retexturização de alta definição nos gráficos de um título, bem como retrabalham a sua trilha sonora de formas mais contemporâneas, com uma remixagem que contemple mais canais de áudio ou mesmo uma composição original refeita.
Esse é, claro, o objetivo principal, mas alguns remasters também trabalham o conteúdo. Essas alterações podem ser cosméticas (erros de tradução entre o japonês e o inglês, por exemplo; os RPGs nipônicos são campeões nisso) ou tratar de divergências de regionalização — em especial, versões diferentes para mercados diferentes do mesmo jogo.
Final Fantasy X Remake e Final Fantasy XII: Zodiac Age são os melhores exemplos de remaster. O primeiro aproveitou a retexturização e retrabalho na trilha sonora para trazer novos recursos de jogo para o Ocidente — especificamente, os chefões opcionais e absurdamente difíceis Dark Aeons e uma nova forma de aprimorar personagens na Sphere Grid (ambos relegados à versão oriental do jogo). Já Zodiac Age trouxe todos os pontos positivos de Final Fantasy XII, um retrabalho completo de imagem e som e um novo sistema de jobs que tornou a parte de evolução e progresso de personagens mais estratégica, com guerreiros desempenhando funções específicas e complementares entre si.
Dentro dessa categoria, há também o que se convém chamar de “rescripting”, ou seja, o jogo é o mesmo, mas aspectos narrativos foram atualizados: geralmente, isso significa uma recondução melhor da progressão do enredo ou inclusão de um novo recurso — jogos com diálogos apenas escritos no original passaram a ter uma dublagem na nova versão, por exemplo.
Remake
Esse é geralmente o termo mais corretamente aplicado quando se fala em videogames. Basicamente, um remake enuncia que o enredo principal de um jogo, seus personagens, história, ambientação, localidades, nomes, gênero... enfim, tudo que se fez presente no jogo original é mantido, mas aplicado no novo jogo de uma forma não apenas diferenciada, mas reconstruída do zero. E isso pode implicar em mudanças sobre como você se lembra do jogo original em relação a este.
Para simplificar, pense nisso da seguinte forma: imagine que uma produtora está “desenvolvendo um título pela primeira vez de novo”. Esse “de novo” é que é o ponto-chave aqui: o jogo é o mesmo, os heróis são iguais, a história não mudou, mas de repente o jogo muda de perspectiva, saindo da visão isométrica para um esquema de ação em terceira pessoa, ou fatos apenas subentendidos do título original passam a ter destaque presencial com a participação do jogador nessa nova produção. Novos esquemas de controle inseridos, novos recursos visuais e outras benesses obviamente recaem aqui.
Naturalmente, pela descrição, você já percebeu do que estamos falando: Final Fantasy VII Remake é o exemplo mais óbvio, já que a Square Enix expandiu tanto esse “jogo refeito” que o que era um lançamento completo em três discos em 1997 (no primeiro Playstation) se tornou três ou mais lançamentos em caráter episódico em 2020, no PlayStation 4. Para se ter uma noção, o atual lançamento — a primeira parte do jogo — tem aproximadamente três a cinco horas no título original, mas a expansão de conteúdo foi tão grande que, no PlayStation 4, elevamos isso para algo entre 25 a 30 horas na primeira partida, isso se você ignorar pontos opcionais.
Vale citar que também se emprega aqui o termo “demake”, ou seja, propositalmente deixar um jogo mais feio ou menos evoluído. Os motivos para isso, se você parar de rir um instante, são bem válidos: às vezes, produtoras querem levar esse jogo para uma plataforma com menos capacidade de hardware.
Ah, sim! Também vale um tipo específico de remake — bem mais raro — que na verdade não “descarta” o jogo original, mas se ambienta no mesmo universo. Doom (2016) e Doom Eternal são casos claros disso: embora a Bethesda tenha divulgado ambos como uma nova releitura do universo criado por John Romero, a produtora acabou revelando pouco depois que os jogos novos são “sequências” que aproveitam a mesma pegada dos jogos antigos, mas trazem enredos não apenas novos, porém continuados das épocas de outrora.
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Reboot
Finalmente, temos aqui o formato mais agressivo e, consequentemente, o mais fácil de ser explicado dentro dessas terminologias. Resumidamente, o reboot é o aproveitamento do conceito mais básico de um jogo original, jogando todo o resto pela janela. Isso significa não “reconstruir” algo do zero, mas fazer algo que se aproveita de uma ideia, mas fazendo de todo o restante algo 100% inédito.
Melhor exemplo disso: DmC — Devil May Cry, aquele do “Dante Emo” de 2013 no PlayStation 3 e Xbox 360. Sim, você ainda jogava como Dante, o caçador de demônios, mas todos os outros elementos (enredo, ambientação, vilões e outros personagens-chave) mudaram completamente. Até o sistema de combate, ainda que dentro do gênero hack and slash, mudou bastante. Em suma, é um outro jogo, que tirou proveito apenas de protagonista e marca.
Outro exemplo que tentou seguir esse caminho foi Castlevania, quando a KONAMI lançou Lords of Shadow em outubro de 2010. Nesse jogo, as únicas similaridades da longeva franquia vampiresca com a nova produção eram o sobrenome do protagonista e elementos de plataforma aplicados em algumas fases. De resto, tudo inédito: combate em ação de terceira pessoa em câmera ampla e aberta a la God of War e uma narrativa cheia de reviravoltas que fazem este destoar de seu título original de forma tão contundente que preferimos não comentar aqui a fim de evitarmos spoilers (sim, sabemos que o jogo tem quase 10 anos, mas mesmo assim…).
Tá, é só isso?
Não. Tem muitas outras atribuições que não entram em nenhuma das categorias acima, mas que merecem uma menção leve. “Sequências espirituais”, por exemplo, são produções aparentemente desconexas, mas que derivam — direta ou indiretamente — de jogos do passado. NieR é um exemplo bem bagunçado disso, já que deriva da franquia Drakengard. Aliás, NieR em si é bem espalhado: uma versão alternativa lançada apenas no Japão, chamada NieR: Replicant, traz um protagonista mais jovem (esse jogo está em vias de ganhar um remaster para PlayStation 4 e Xbox One). Mais diretamente, o recente e bem-sucedido NieR Automata é uma sequência de NieR ambientada centenas de anos depois.
Ou seja, temos aqui uma sequência direta de uma sequência de um spin-off, que por sua vez é uma sequência espiritual de um outro jogo de décadas atrás.
Isso quando uma "sequência" não tem um predecessor no jogo, mas sim em outra mídia, como é o caso de Mad Max, lançado em 2015 para várias plataformas. O jogo nunca teve um título anterior, mas, essencialmente, é uma sequência não-oficial do filme Mad Max: Estrada da Fúria, já que o vilão do jogo, Scabrous Scrotus, é o terceiro filho de Immortan Joe, o antagonista do filme.
Fácil, não?