BCE mantém recusa em dar explicações directas ao Tribunal Constitucional alemão
by Sérgio AníbalBanco central não recua e pode, numa altura em que as previsões para a economia se tornam mais negativas, reforçar compra de dívidas já em Junho.
Isabel Schnabel, a representante alemã no conselho executivo do Banco Central Europeu, tornou-se esta quarta-feira na mais recente responsável da autoridade monetária a tornar claro que o Tribunal Constitucional Federal alemão não irá poder contar com as explicações directas sobre o programa de compra de activos que exigiu ao BCE. O problema, disse em entrevista ao Financial Times, terá de ser resolvido através de um diálogo entre as diversas instituições alemãs: o tribunal, o governo, o parlamento e o Bundesbank.
Esta tem sido, desde o início, a resposta do BCE à sentença emitida pelo Tribunal Constitucional Federal – que decidiu que o Bundesbank terá de deixar de participar no programa de compra de activos do BCE se este não der explicações adicionais sobre a proporcionalidade da sua política.
Os responsáveis do banco central têm dito que apenas estão sob a jurisdição do Tribunal de Justiça Europeu e que este já aprovou o seu programa de compras de activos.
A resposta, desta vez, tem ainda mais força porque vem da representante alemã no conselho executivo do BCE (constituído por seis membros, incluindo a presidente e o vice-presidente da instituição).
Isabel Schnabel disse ao Financial Times (numa entrevista transcrita na íntegra na página de internet do BCE) que a sentença do tribunal constitucional alemão “não afecta directamente” o BCE e disse estar confiante que “haverá comunicação entre o Bundesbank, o parlamento alemão e o governo alemão, uma solução terá de ser encontrada”.
Questionada sobre as consequências de um eventual abandono por parte do banco central alemão do programa de compras de activos do BCE, Isabel Schnabel limitou-se a dizer que “isso não irá acontecer”.
A economista alemã – que no final de 2019 foi nomeada para o conselho executivo do BCE, substituindo a também alemã Sabine Lautenschlager que tinha abandonado o cargo em desacordo com a política seguida pelo banco central – tentou também na entrevista ao Financial Times passar a ideia de que a actuação do BCE durante a presente crise tem sido recebida pela opinião pública alemã de forma “bastante positiva”, e que isso “se reflectiu nas reacções à sentença do tribunal”. “Claro que houve alguns a apoiar a sentença, mas também se ouviram bastantes vozes críticas”, disse.
Isabel Schnabel, da forma mais assertiva alguma vez ouvida num responsável do BCE oriundo da Alemanha, defendeu a necessidade de compras de dívida pública por parte do BCE, incluindo com o objectivo de limitar os riscos de um alargamento dos spreads da dívida entre os países da zona euro.
A desintegração da zona euro e uma maior divergência entre os países são nesta altura riscos bem mais importantes do que riscos relacionados com a subida da inflação, defendeu, elogiando ainda a proposta franco-alemã para um fundo de recuperação.
Reforço das compras à vista
A entrevista de Isabel Schnabel surge numa altura em que se torna cada vez mais provável que o BCE venha, na reunião do conselho de governadores agendada para o início de Junho, a reforçar o seu programa extraordinário de compras de dívida de 750 mil milhões de euros.
Esta quarta-feira, o governador do banco central francês afirmou que o BCE, tendo em conta a dimensão da crise económica, “terá muito provavelmente de ir mais além”.
Uma ideia que sai reforçada com as declarações, também esta quarta-feira, da presidente do BCE sobre as projecções de contracção económica na zona euro durante este ano. O banco central tinha, no dia da sua última reunião, traçado três cenários para a evolução da economia: um mais benigno em que o PIB caia 5%, um médio com uma contracção de 8% e um negativo em que a queda chegaria a 12%.
Agora, falando numa conferência, Christine Lagarde afirmou que o cenário mais benigno já está desactualizado e a que “a contracção económica estará provavelmente entre os cenários médio e severo”. Isto é, a economia da zona euro poderá cair entre 8% e 12% em 2020.
Ainda tentando passar o optimismo possível, a presidente do BCE mostrou-se confiante de que “não haverá uma nova crise do euro a seguir à pandemia”, declarando-se “não excessivamente preocupada com os níveis elevados de dívida pública”.