Ministro do STJ pede investigação sobre suposto vazamento de operação contra Witzel
Suspeitas de vazamento foram levantadas por declarações feitas antes de a operação ser deflagrada
O ministro Benedito Gonçalves, do STJ (Superior Tribunal de Justiça, pediu nesta quarta-feira (27) ao Ministério Púbico Federal que investigue o suposto vazamento de ação da Polícia Federal no Rio de Janeiro contra o governador Wilson Witzel (PSC).
Segundo o magistrado, caso seja confirmado o vazamento, seria necessário responsabilizar penalmente o autor da conduta ilícita, como forma de não prejudicar a integridade das instituições.
As suspeitas de vazamento foram levantadas na terça (26) após a deflagração da operação. Na noite anterior, em entrevista à Rádio Gaúcha, a deputada bolsonarista Carla Zambelli (PSL-SP) disse ter conhecimento de que investigações contra governadores estavam em andamento, por conta dos gastos para combater a Covid-19, e que em breve operações seriam lançadas.
Na entrevista, Zambelli diz ainda que as operações já estavam na "agulha", mas só ocorreram após a a demissão do ex-ministro da Justiça Sergio Moro.
À Folha, a deputada negou que tivesse informações prévias sobre operações da Polícia Federal contra governos estaduais, como a lançada na terça no Rio.
Em suas redes sociais, Zambelli foi cobrada pela parlamentar Talíria Petrone (PSOL-RJ) sobre ter falado em entrevista sobre a ocorrência de "operações" nos próximos meses.
"Se eu tivesse informações privilegiadas e relações promíscuas com a PF, a operação de hoje seria chamada de "Estrume" e não "Placebo". Está aí sua explicação, defensora de maconheiro", respondeu a deputada.
Com um pouco mais de cuidado, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) também deu a entender que poderia ter conhecimento prévio de novas ações da Polícia Federal. Na noite desta segunda-feira (25), o parlamentar divulgou o vídeo de uma ação de busca e apreensão em Fortaleza, quando sugeriu que outras poderiam acontecer.
"Os que achavam que se aproveitariam da pandemia para roubar e ficar impunes se enganaram. E acredito que tenha muito mais operação para vir aí. O que vocês acham?", postou Eduardo Bolsonaro, em suas redes sociais.
Em nota, a Fenapef (Federação Nacional de Policiais Federais) defendeu a apuração de eventual vazamento da ação pela deputada e fez associação à entidade ligada aos delegados federais.
"É conhecido e notório o vínculo da parlamentar com a Associação de Delegados, desde quando era líder do movimento Nas Ruas. Esse laço se demonstra pela participação de Zambelli em eventos, vídeos e homenagens. A Fenapef defende a apuração, com responsabilidade e profundidade, sobre a possibilidade de que esse vínculo possa ter sido utilizado para a obtenção de alguma informação privilegiada", afirmou a federação em nota.
Em resposta, a ADPF (Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal) afirmou "repudiar veementemente a irresponsável nota" da federação.
"A ADPF, independentemente da apuração, irá imediatamente tomar as medidas judiciais cabíveis para que os dirigentes da Fenapef provem as insinuações que fizeram ou respondam pelas leviandades lançadas publicamente e entendam que divergências classistas não estão acima da ética, da moral, tampouco do nome e da credibilidade da Polícia Federal", diz a nota que trambém pede a apuração do suposto vazamento.
Questionada sobre a entrevista de Zambelli, a Polícia Federal disse que não comenta declarações de parlamentares.
A ação contra o governador do Rio foi chamada de Placebo. De acordo com as investigações, Witzel estaria no topo de uma organização que fraudou o orçamento até das caixas d’água de hospitais de campanha no Rio.
Dados da investigação, enviados pelo Ministério Público Federal no Rio ao STJ , afirmam que Witzel “tinha o comando” das ações para, supostamente, lesar a gestão das unidades de saúde.
Para isso, seria auxiliado por sua mulher, Helena Witzel, e pelo ex-secretário de Estado da Saúde Edmar Santos, que delegou algumas atribuições a subordinados sob investigação.
Segundo o inquérito, que tramita em sigilo, houve ilegalidades no processo de contratação da organização social Iabas para administrar os hospitais provisórios. Para isso, diz a investigação, foram fraudados os valores dos orçamentos de diversos itens do atendimento a vítimas da Covid-19.
A PF cumpriu 11 mandados de busca e apreensão no Rio de Janeiro e São Paulo para apurar supostas fraudes. Agentes foram ao Palácio Laranjeiras, residência oficial do governador, e à antiga casa de Witzel no Grajaú, zona norte do Rio de Janeiro.
Após a ação, Witzel negou que tenha cometido irregularidades e usou as declarações da deputada Carla Zambelli para afirmar que a ação foi política.
"Não há absolutamente nenhuma participação ou autoria minha em nenhum tipo de irregularidade nas questões que envolvem as denúncias apresentadas pelo Ministério Público Federal. Estou à disposição da Justiça, meus sigilos abertos e estou tranquilo sobre o desdobramento dos fatos", disse o governador, em nota.
"Quero manifestar minha absoluta indignação com um ato de violência que hoje o Estado democrático de Direito sofreu. A narrativa que construída e foi levada ao ministro Benedito é absolutamente fantasiosa. Não vão conseguir colocar em mim o rótulo da corrupção", completou.
LEIA NA ÍNTEGRA A NOTA DO GOVERNADOR WILSON WITZEL
"Não há absolutamente nenhuma participação ou autoria minha em nenhum tipo de irregularidade nas questões que envolvem as denúncias apresentadas pelo Ministério Público Federal. Estranha-me e indigna-me sobremaneira o fato absolutamente claro de que deputados bolsonaristas tenham anunciado em redes sociais nos últimos dias uma operação da Polícia Federal direcionada a mim, o que demonstra limpidamente que houve vazamento, com a construção de uma narrativa que jamais se confirmará. A interferência anunciada pelo presidente da república está devidamente oficializada. Estou à disposição da Justiça, meus sigilos abertos e estou tranquilo sobre o desdobramento dos fatos. Sigo em alinhamento com a Justiça para que se apure rapidamente os fatos. Não abandonarei meus princípios e muito menos o Estado do Rio de Janeiro".