SpaceX: à beira da maioridade e de uma parceria com futuro
by Tiago HormigoO voo da missão experimental Demo-2 representa a passagem da SpaceX à maioridade. Dezoito anos após a fundação da empresa, a missão será o último teste da cápsula Dragon 2 antes da entrada em operação daquele que será o primeiro veículo privado para missões orbitais tripuladas. Seguir-se-ão a primeira missão operacional do programa (Setembro de 2020) e, em 2021, as primeiras duas viagens de turismo orbital desde 2009, um mercado que pode vir a ser bastante promissor para a SpaceX (embora ainda por testar).
Para a NASA, é o retorno aos voos orbitais tripulados desde o último lançamento do vaivém espacial Atlantis, em Julho de 2011. Desde então a agência investiu mais de 30 mil milhões de dólares no programa Artemis com a ambição de alunar o mais tardar em 2024 – sem sucessos até hoje. No mesmo período, a SpaceX tornou o primeiro andar do seu lançador Falcon 9 reutilizável, construiu o foguetão mais potente da actualidade (Falcon Heavy) e desenvolveu duas cápsulas para a NASA – uma para transporte de carga (Dragon, que já voou 20 vezes até à Estação Espacial Internacional), e outra tripulada (a Dragon 2). Já este ano, a empresa ganhou contratos com a NASA para desenvolver o transportador Dragon XL (para reabastecer a futura estação Lunar Gateway) e para transportar humanos da órbita lunar para a superfície (com recurso ao veículo Starship).
A ausência de resultados palpáveis nos contratos do programa Artemis com os seus fornecedores históricos (Boeing e Lockheed Martin) está a pressionar a NASA para procurar alternativas. E tendo em conta a forte pressão política para se chegar à superfície da Lua dentro de um prazo irrazoável, assim como a aceleração progressiva da capacidade de inovação e de execução da SpaceX face à sua concorrência, é previsível que esta tendência se intensifique, com benefícios (pelo menos no imediato) para ambos.
Este não é necessariamente o resultado ideal para a SpaceX, já que os contratos com a NASA implicam uma supervisão constante das suas actividades, e as prioridades estratégicas da empresa estão noutros quadrantes (no sistema de telecomunicações por satélite Starlink, que deverá iniciar operações já em Agosto, e no desenvolvimento do lançador reutilizável Super Heavy/Starship, capaz de transportar mais de 100 toneladas para órbita a preços uma ordem de grandeza inferiores aos actuais).
Mas é uma solução de compromisso, que compatibiliza as abordagens sonhadora do seu fundador Elon Musk e pragmática da presidente Gwynne Shotwell, e que com o sucesso da Demo-2 (e dos restantes projectos com a NASA) representará receitas estáveis para a empresa no médio prazo. Será esse o prazo requerido para que o projecto Starlink possa começar a dar frutos (potencialmente dezenas de milhar de milhão de dólares anuais), e para que o amadurecimento progressivo do revolucionário Starship aproxime a empresa do seu objectivo último: a execução de viagens tripuladas a Marte.
Engenheiro aeroespacial e co-fundador da empresa portuguesa Spin.Works