Finanças admitem que estão a atrasar os pagamentos dos reembolsos de IRS
by Luís Reis Ribeiro"Evolução da receita fiscal de 3,8% é explicada pelo aumento da receita líquida do IRS em 17,8%, associado à diminuição de reembolsos, mas isto será corrigido nos meses seguintes", garante o gabinete de Centeno. O défice orçamental disparou.
A lentidão no pagamento dos reembolsos do IRS deu ao imposto o melhor arranque de época (primeiros quatro meses de 2020) em sete anos, indicam dados ontem revelados pelas Finanças e cálculos do DN/Dinheiro Vivo.
Segundo a nota sobre a execução orçamental até abril, do gabinete do ministro Mário Centeno, o défice deste quadrimestre já subiu muito (mais de 25%), refletindo fortes reduções na receita e aumentos pronunciados na despesa pública por causa da pandemia de covid-19.
No entanto, as Finanças admitem que estão a estender no tempo (a atrasar, no fundo) os pagamentos dos reembolsos em sede de IRS, o que será uma forma de conservar mais verbas em caixa e amortecer os enormes choques de tesouraria que a crise está a provocar nas contas do Estado. Em todo o caso, o gabinete de Centeno promete que, ao longo do ano, esta situação será "corrigida".
Essa lentidão no pagamento dos reembolsos de IRS fez que a receita líquida de IRS tenha disparado 17,8% nos primeiros quatro meses do ano comparativamente a igual período de 2019. É preciso recuar sete anos, a 2013, o ano que reflete o "enorme aumento de impostos" de Vítor Gaspar e do Governo PSD-CDS), para encontrar um ritmo de expansão tão elevado da receita em IRS nesta altura do ano. A subida foi, então, de quase 25% em termos homólogos.
A retenção de reembolsos permitiu que a receita fiscal e de IRS não sofresse um colapso, pelo menos para já. O mesmo não aconteceu aos outros impostos.
"A evolução da receita fiscal (3,8%) é explicada pelo aumento da receita líquida do IRS (17,8%) associado à diminuição de reembolsos, mas que será corrigido nos meses seguintes", diz a nota oficial das Finanças.
"Os restantes impostos apresentaram quebras, reflexo do abrandamento económico (exceto imposto de selo e outros impostos diretos)." O ritmo de crescimento das contribuições para a Segurança Social travou para quase metade. Até abril, os descontos estavam a crescer 4%, "mantendo a tendência de desaceleração face aos meses pré-covid-19 (até fevereiro a receita com contribuições crescia 7,4%)".
Défice reaparece em força: sobe 25% até abril
Apesar do bom comportamento da receita de IRS, "a execução orçamental em contabilidade pública das Administrações Públicas registou até abril um défice de 1651 milhões de euros, um agravamento de 341 milhões de euros face ao período homólogo por via do menor crescimento da receita (5%) face ao da despesa (6,1%)", anunciaram, nesta terça-feira, as Finanças.
É uma redução homóloga do saldo orçamental de 26% nos primeiros quatro meses deste ano (ou um aumento do défice nessa mesma ordem).
"A execução até abril já evidencia os efeitos da pandemia na economia e nos serviços públicos na sequência das medidas de mitigação", confirma a nota oficial.
As Finanças fazem um resumo dos impactos da crise do coronavírus nas contas públicas. No total, esta crise custou, até agora (mês e meio, desde meados de março a final de abril), qualquer coisa como 660 milhões de euros.
A quebra de receita foi de 320 milhões de euros a menos "com a prorrogação dos prazos de entrega das retenções na fonte de IRS, IVA e IRC" e isto ainda sem quantificar o efeito da prorrogação das contribuições para a Segurança Social e a suspensão das execuções fiscais.
Em contrapartida, a despesa cresceu 345 milhões de euros, "principalmente associado às medidas de lay-off (144 milhões), aquisição de equipamentos na Saúde (128 milhões) e outros apoios suportados pela Segurança Social (54 milhões)".
Mais 8200 funcionários no SNS em apenas um ano
Do lado da despesa, como é hábito, o Ministério das Finanças releva a "aposta" do Governo no Serviço Nacional de Saúde (SNS). Centeno fala do "forte crescimento do investimento público, da despesa do SNS e das prestações sociais. A despesa primária cresceu 7,6% influenciada pelo expressivo crescimento da despesa do SNS em 12%, nomeadamente em despesas com pessoal (6%)", diz o comunicado.
O rol de salários dos funcionários públicos cresceu 4,5% (corrigida de efeitos pontuais) e "destaca-se o reforço de mais 8204 profissionais afetos ao SNS, um aumento homólogo de 6,3%" em relação aos primeiros quatro meses de 2019.
As Finanças garantem ainda que "os pagamentos em atraso no setor da saúde reduziram-se em 345 milhões de euros face a abril de 2019".
Investimento público dispara mas sem contar com PPP
O investimento público, que foi um vetor de forte contenção na despesa em 2019 e ajudou a chegar ao excedente público histórico de 0,2% do PIB, está agora a subir em flecha.
Segundo as Finanças, olhando apenas para a conta da Administração Central e da Segurança Social, "o investimento público aumentou 78,6%", mas isto excluindo as parcerias público-privadas (PPP) que deformam estes números, uma vez que o Estado continua a ter de pagar centenas de milhões de euros aos concessionários privados, o que abate ao investimento total.
Sem o efeito depressor das PPP, o investimento dispara, "refletindo a forte dinâmica de crescimento no âmbito do plano de investimentos Ferrovia 2020 e de outros investimentos estruturantes e ainda a aquisição de material médico para o combate à covid-19 destinado aos hospitais".
Jornalista do Dinheiro Vivo