Dia Nacional da Adoção
Brasil: Processo de adoção está mais rápido, mas barreiras ainda existem
No Dia Nacional da Adoção, conheça histórias de quem vive e viveu o processo de adoção no país; “idade” e “irmãos” são apontados como barreiras para quem deseja adotar
Julia Beck,
Da redação
Natural de Piquete, interior de São Paulo, Pedro, de 9 anos, está entre as mais de 9 mil crianças que estão aptas à adoção no Brasil. No dia em que o país celebra o Dia Nacional da Adoção, 25 de maio, os avanços na celeridade dos processos de adoção, surgidos após a implantação do novo Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (SNA), são festejados, mas as principais barreiras para a concretização das adoções ainda se mostram desafiadoras.
Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), as dificuldades nos processos de adoção ainda estão na idade das crianças e no fato de possuírem irmãos, apesar de, muitas vezes, existir possibilidade de desmembrar um grupo de irmãos em duas ou mais adoções.
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Atualmente, das 9,3 mil crianças cadastradas no Cadastro Nacional de Adoção (CNA), 6,4 mil têm entre sete e 17 anos e 56% possuem irmãos. Em contrapartida, dos 45,2 mil pretendentes cadastrados, apenas 6,7 mil aceitam crianças com idade entre sete e 17 anos e 37% aceitam adotar irmãos.
O destino das crianças que estão aptas à adoção é o abrigo ou a acolhida em casas de parentes ou padrinhos – que até a conclusão do processo de adoção tornam-se guardiões da criança.
Enquanto aguarda adoção, Pedro não precisou ser encaminhado para um abrigo, já que foi acolhido por Marcelo Ribeiro e Flávia Luciana Ribeiro. O casal conheceu o menino após a morte de sua mãe. Flávia teve o primeiro contato com Pedro em um grupo de oração, no qual faz parte.
“Um dia, um dos membros do grupo levou o filho dessa moça que havia falecido para receber orações. (…) Pediram para minha mãe para que ela rezasse pelo menino, pois ele estava chorando muito e com saudades da mãe. Minha mãe rezou por ele e aquele foi o primeiro contato que eles tiveram. Naquele momento de dor e fragilidade, minha mãe se encontrou com ele”, contou a filha de Flávia, a estudante Rayane Ribeiro.
Pedro voltou ao grupo de oração, acompanhado de um responsável, perguntando por Flávia e pedindo por suas orações. Desde então, a relação entre os dois foi de proximidade, até Flávia ser convidada para ser madrinha de batismo de Pedro. Rayane relata que neste período de dor, o menino passou a sofrer bullying na escola e a reagir com violências às provocações dos colegas, o que gerou transtornos e uma dificuldade entre os guardiões de sua tutela, seus tios.
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O menino passou a frequentar a casa da família de Rayane, aos finais de semana e, após morar com duas tias diferentes, teve sua tutela entregue a Flávia. Depois de receber uma ligação do Conselho Tutelar, comunicando que a única maneira de Pedro não ser encaminhado para um abrigo, seria se sua guarda provisória fosse entregue à sua madrinha, Flávia acolheu o menino. “Super aceitamos, falamos para minha mãe que gostamos muito dele”, comenta Rayane.
Por dificuldades financeiras, os padrinhos de Pedro não podem assumir permanentemente a guarda do menino, mas o acolheram nesse primeiro momento. “Foi um alívio muito grande ter ficado com essa guarda provisória. Conseguimos aliviar esse fardo pesado que ele carrega. Foi o coração e o amor que falaram mais alto. (…) Saber que não tem mais essa hipótese dele ir para um abrigo é um alívio, porque a base de tudo para uma criança é a família, e isso podemos oferecer para ele de imediato”, comentou a madrinha do menino.
Flávia diz conversar muito com Pedro sobre a adoção: “Disse para ele que ele só sai da minha casa se o meu coração e o dele sentirem que a família que deseja tê-lo é de fato sua nova família. Ele fica seguro com isso, pois sabe que só o deixarei ir se ele se sentir amado”.
Mateus Marques Ramos, autor e roteirista de 25 anos, já esteve, assim como Pedro, à espera da adoção. “Fui entregue para adoção ainda muito novo, com 15 dias de nascido”, afirma o jovem. O encontro com os pais aconteceu após uma missa. “Meus pais foram abordados por uma prima da minha mãe, que trabalhava no conselho tutelar, ela perguntou se poderiam ficar com uma criança recém-nascida até encontrarem um casal disposto a adotar”.
O que seria uma guarda provisória tornou-se uma adoção depois dos pais de Mateus decidirem que queriam ficar com ele. “Deram entrada nos procedimentos legais e eu fui adotado”. O jovem afirma que a realidade da adoção sempre foi tratada com muita naturalidade e com muita verdade pelos seus pais. “Eles nunca esconderam o fato e sempre me educaram no sentido de que eu fui gerado não biologicamente, mas sim no coração, e isso não foi um drama para mim, é algo que considero natural”.
A adoção é definida por Mateus como um presente. “Na minha vida eu ganhei de presente os meus pais, e na vida deles eles me ganharam. Fomos todos presenteados!”, frisou o jovem que contou que seu nome significa “Presente de Deus”.
Ao falar sobre o amor e a relação com seus pais, Mateus comentou: “Existe um filósofo, cujo nome me foge à memória, que diz que o filho biológico é amado por que é filho, já o filho adotivo se torna filho por que é amado, creio que seja exatamente assim”.
O autor e roteirista conta que, assim como os pais, também adotaria uma criança: “Não tanto pelo fato de ser adotado, mas porque acredito que não se trata apenas de uma vontade ou desejo, mas que o desejo de adotar talvez revele um chamado especial, uma vocação”.