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((Foto: Valter Pontes/Coperphoto/Sistema FIEB))

Ricardo Alban: “O Brasil precisa estabelecer um plano para desenvolver a sua indústria”

Presidente da Fieb defende planejamento para o setor e fala sobre adaptação à crise gerada pela pandemia

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Há uma lição a ser aprendida neste momento, acredita o empresário Ricardo Alban. “O Brasil precisa fazer uma política industrial”, defende. Ele lembra que a última vez que isso aconteceu no país foi no período militar. E isso pode trazer alguma confusão, pondera. “Da última vez que tivemos política industrial, era uma política protecionista. Não estamos defendendo fechamento de mercado. O que nós queremos é que haja um planejamento para o setor”, explica. Neste sentido, o presidente da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb) acredita que o momento atual está cobrando um preço alto para a indústria brasileira, mas ao mesmo tempo mostrando o comprometimento do setor com o desenvolvimento do país e a sua capacidade de resistir às dificuldades.

Qual é o futuro da nossa indústria?
Algumas lições vão ter que ser assimiladas. A principal delas é que a gente resolva de uma vez por todas fazer uma política industrial, para que a gente possa ter cadeias produtivas mais sustentáveis e independentes. Essa será a grande discussão socioeconômica do Brasil neste pós-crise. Há muito tempo, o Brasil não tem uma política industrial, aí vem o Paulo Guedes (ministro da Economia) com esse conceito liberal de que importa só cortar custos e estamos vendo que isso não responde todas as questões. É óbvio que temos que criar as condições de competitividade, mas falta um pouco do que o Donald Trump vem fazendo desde que assumiu o governo nos EUA. Não faz sentido em um mundo tão dinâmico o liberalismo puro, ou socialismo puro. Tudo é uma adaptação.

Como a indústria vai sair da pandemia?
Seguramente mais combalida do que entrou. O Brasil já vinha em um processo de desindustrialização, isso era um fato. Seja pela perda de competitividade, de nível de produtividade, formação profissional, temos um custo Brasil alto, problemas de infraestrutura, entre outros problemas. Isso infelizmente já era uma realidade que vinha acontecendo. O governo tinha um programa para mitigar algumas dessas coisas e elas ainda não foram concluídas. Não é só uma Reforma da Previdência. Temos o plano anunciado pelo governo de trazer o preço do gás para um patamar racional, o que é muito bom em um país com uma das matrizes energéticas mais caras do mundo. Esse processo vai se agravar muito porque o mundo inteiro vai buscar ser mais competitivo. É urgente pensar em política industrial. A última vez que isso aconteceu, obviamente com um viés muito nacionalista, foi com os militares. A dinâmica hoje precisa ser outra, entretanto é preciso pensar numa política para o setor. Temos que trabalhar para buscar a sustentabilidade e o encadeamento produtivo de alguns setores. É algo que se faz no mundo inteiro.

Muitas vezes se confunde a necessidade de estabelecer um plano para desenvolver a indústria com o protecionismo e o fechamento do mercado.
Acabam confundindo isso com subsídios, com protecionismo, e não é nada disso. O fato é que precisamos ter a capacidade de preservar e desenvolver setores estratégicos para o país. Este momento está expondo essa realidade. O Brasil precisa voltar com muito foco nas condições de competitividade e estabelecer um plano para desenvolver a sua indústria. Infelizmente, estamos vivendo, como no mundo inteiro, uma crise de saúde e, também como no mundo inteiro, iremos enfrentar uma crise econômica e social. Só que aqui ainda temos o agravamento de uma crise política que não fazemos ideia de como vai terminar.

O que o senhor espera do segundo semestre?
Não sei, sinceramente. Me preocupa demais. Agora, todos têm consciência da situação, mas lá na frente nós não sabemos como essa crise vai influenciar no nosso dia a dia. Para que tantos embates? Não entendo como se pode administrar qualquer coisa buscando o confronto sempre.

A Fieb apresentou recentemente três cenários para o PIB brasileiro, um com perdas severas, outro com menos danos, além de um terceiro, intermediário. Atualmente, estamos mais próximos de qual destes?
Sou um otimista, mas as perspectivas que a gente vê para a economia são muito complicadas. Todas as avaliações que temos visto pelo Banco Central, por bancos privados, indicam que estamos caminhando para o cenário pior, muito mais para o pessimista do que para o intermediário. A principal preocupação é exatamente em saber como vai se dar esse desdobramento político. O mundo inteiro já planeja o day after, mas nós com esse cenário político não temos tranquilidade para preparar isso. Planejamento é tudo, nada se faz de improviso.

Como está sendo a adaptação do setor industrial baiano a este cenário?
Dizem que o brasileiro é muito criativo. Aquelas que tem facilidade para se reinventarem estão se reinventando. Temos exemplos no setor têxtil. Eles fizeram uma adaptação para a produção de máscaras que tem um universo limitado. Empresas de cosméticos se adaptaram para produzir álcool gel e hoje o mercado já está relativamente bem abastecido. Há 45 dias estavam todos preocupados em ter máscaras e em adquirir álcool. A parte de saneantes continua a ter uma demanda razoável. Agora, você tem setores que estão parados. Quem produz bens duráveis está sofrendo bastante. Uma fábrica de automóveis produzir 2 mil unidades em abril? É o mesmo que não produzir nada. Isso tem um impacto enorme sobre toda uma cadeia, que passa pela fábrica em si, sua cadeia de fornecedores e chega ao comércio. Em alguns casos, resolveu-se com criatividade, mas em outros o prejuízo está sendo gigantesco. O grande problema hoje do setor produtivo, principalmente do pequeno e médio, está no acesso ao crédito. O risco aumentou e quando isso acontece, os bancos se retraem.

Você tem também uma retração do consumidor.
Só vai investir naqueles bens de primeira necessidade. O consumidor vai postergar tudo o que puder em termos de compras, sem falar que o setor de serviços vai sofrer por muito mais tempo. O turismo, que foi quem mais sofreu, vai enfrentar as repercussões mais duradouras. Dificilmente, qualquer cidadão de classe média que viaja uma vez por mês, ou se organiza para ir ao exterior uma vez por ano, vai manter esse hábito nos primeiros momentos pós-crise.

Foram anunciadas diversas medidas de apoio ao setor produtivo. Essas iniciativas chegaram à ponta?
De fato, quase nada. Tudo o que diz respeito a crédito, que é o ponto mais sensível para nós neste momento, passa por decisão de bancos. Mesmo um banco público. Para essas instituições, quanto menor a empresa, mais subjetivos são os critérios para a concessão de crédito. Eu sou o maior crítico do Sistema Financeiro. Foram extremamente beneficiados nos últimos 15 a 20 anos. Todas essas ações de doações que estão anunciando é o mínimo que poderiam fazer depois de tudo o que ganharam. Mesmo tendo ciclos de autos e baixos. Já passou da hora de o setor financeiro voltar a ser um indutor do desenvolvimento econômico. O papel deles é fazer a intermediação financeira e isso é o que eles menos fazem porque tem o governo como seu grande governo. E as fintechs ainda não são grandes concorrentes.

Conteúdo especial do projeto Indústria Forte, iniciativa do CORREIO, com o patrocínio do Hapvida, Sotero Ambiental e Yamana Gold, apoio da Claro, FIEB e Larco e parceria do Sebrae