Resposta à fúria da natureza

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Uma cidade inteligente, pelo lado tecnológico, precisa de iluminação adequada. Boa parte das cidades brasileiras tem menos da metade da intensidade de luz definida pela ABNT como mínima. Precisa ter conectividade. Sensores precisam se conectar a Centros de Operação e Controle. Os vários sensores e câmeras precisam ser geridos, e essa gestão passa por um sistema (conjunto de softwares). Só que paralelo a isso tudo é necessária infraestrutura.

É difícil crer que uma cidade com mais de 12 milhões de habitantes tenha orçado segunda a prefeitura, R$807 milhões para investimento em prevenção a enchentes e gasto somente R$680 milhões. A cidade de São Paulo gastou o correspondente a R$0,16 por dia no último ano, por cidadão. Não estamos aqui avaliando se o orçado era adequado à necessidade, mas sim onde houve a falha, no orçamento ou na execução?

A estimativa com investimento em infraestrutura que não aparece é sempre um dilema na política. Se não chover forte (o que é muito difícil no sudeste do Brasil, devido às características climáticas) não gera desgaste político e o dinheiro pode ser investido no que “dá voto”.

Vamos voltar aos números, será que os prejuízos a São Paulo foram menores que o investimento? Será que os paulistanos, se questionados, concordariam em investir mais que o investido, o correspondente a R$56,00 por cidadão por ano? A questão não é o que se investe na prevenção, é se o investimento está sendo na causa e não no efeito.

É muito fácil ir à TV dizer que foi um fato isolado, por ter sido a maior chuva dos últimos 37 anos. Ora, se já aconteceu há 37 anos chuva maior que essa, outras pouco menores, neste intervalo, ocorreram. Não há como ignorar, elas são recorrentes.

Só na última segunda-feira, foram 86 alertas só na cidade de São Paulo, na Grande São Paulo, mais de 5.000 chamados para o corpo de bombeiros, 182 desabamentos, mais de 1.000 pontos de inundação e 206 arvores caídas.

A Ceagesp, principal entreposto de armazéns da Grande São Paulo, estima prejuízo direto de mais de R$24 milhões. Esta estimativa está bem longe do prejuízo estimado pela Fecomércio, em torno de R$110 milhões. Ainda muito longe do custo para a recomposição de vias, a contenção de encostas, os veículos danificados, as perdas de móveis e utensílios domésticos, sem contar as vidas perdidas. Somados podem custar mais de R$6 bilhões de reais. Quase 10 vezes o investido por São Paulo na prevenção no último ano e quase o dobro do efetivamente investido nos últimos 10 anos.

Qual o caminho? Uma cidade inteligente planeja e executa o planejamento com diligência. Hoje podemos mapear a cidade e reanalisar, através de simulações computacionais, o curso de rios, nascentes, as florestas, escoamento de água em encostas etc. Estas simulações trazem dados fundamentais ao planejamento. Conseguimos calcular quanto de água vai escoar e por onde e assim redimensionar o sistema de drenagem desta água. Cabe lembrar que cobrimos as cidades com concreto e asfalto, tornando estas vias impermeáveis.

A cobertura vegetal da cidade do Rio de Janeiro é de mais de 50% (dados da prefeitura), cada Carioca tem o correspondente a 94m2 de área com cobertura vegetal. Já em São Paulo os dados não são claros, o que é ruim, mas é visivelmente muito inferior à este número, principalmente por ter uma população de 12,2 milhões de habitantes, segundo estimativa do IBGE. Isso significa que se a cidade de São Paulo tiver a metade da área de cobertura do Rio de Janeiro, cada paulistano tem o correspondente a 32m2 de cobertura vegetal. Só para um exercício, o carioca tem a área correspondente a um apartamento de 3 quartos enquanto o paulistano ficaria só com a sala deste apartamento, muito pouco, não?

Nesta terça, quarta e quinta-feira a chuva continua forte no Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo. Como estão as cidades destes estados? Despreparadas, como pudemos ver nas últimas semanas.

O desafio é o investimento contínuo em projetos de longo prazo, não é com soluções paliativas que vamos conseguir corrigir desvios de séculos. Precisamos encarar os problemas de frente e desenvolver soluções. Minha sugestão aqui é que busquemos as mais simples primeiro e depois as de alta engenharia e que demandam tempo no desenvolvimento.

Onde estão os Conselhos Regionais de Engenharia e Agronomia - CREA e o Conselho Federal de Engenharia e Agronomia – Confea nisso tudo? Chamando à responsabilidade seus técnicos? Será que são Conselhos preocupados somente com a arrecadação? Acredito que eu tenha contribuído nas últimas décadas para um organismo preocupado com o bom desempenho dos seus profissionais. Com a responsabilidade cívica acima de tudo.

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