Me causa repugnância

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Por vezes eu sinto vergonha de gostar tanto de futebol. Não pelo fato do esporte ser “a coisa mais importante dentre as menos importantes”, como bem cunhou Arrigo Sacchi, técnico italiano vice-campeão Copa de 1994. Muito pelo contrário. O jogo é imprescindível para muitos, pois é válvula de escape nesta vida cada vez mais exasperante, com seus momentos únicos em que nada mais importa que a eternidade de 90 minutos. É no futebol que ricos e pobres são iguais na alegria da vitória ou na tristeza da derrota. É essa universalidade que faz da bola no pé das coisas mais importantes.

(…deixa eu respirar para retomar o foco. Sempre que falo de futebol me entusiasmo brevemente.)

Voltando ao assunto, por vezes, sinto vergonha de gostar tanto de futebol. E quase sempre é pelo tal de “comportamento manada”, que é mais ou menos quando um grupo de pessoas reage de forma coordenada sem razão planejada. Ou melhor: sem razão mesmo! É exatamente isto que acontece quando vemos bandos se digladiando porque um não gostou da camisa de time do outro. O mesmo ocorre quando, na dor de uma derrota, uma horda sai depredando o estádio seja ele patrimônio do adversário; de seu próprio clube ou de sua própria comunidade. Mais do que vergonha, tal atitude irracional me causa repugnância.

Foi exatamente tal sentimento que tive na última quarta-feira, ao ler as notícias sobre o comportamento de parte da torcida do Fluminense. Durante o Fla-Flu, tricolores, em número significativo, dirigiram à equipe e aos torcedores adversários o grito de “time de assassino”. A alusão à tragédia que vitimou dez jovens no incêndio do Ninho do Urubu em fevereiro do ano passado é de desumanidade incomensurável. Usar de tamanha dor como ferramenta de provocação é algo irracional, que só pode ser explicado pelo animalesco efeito manada, que, por vezes variadas, transforma pessoas comuns em verdadeiros idiotas.

Por muitas vezes também, as pessoas confundem rivalidade com agressão e irracionalidade. É isto que me faz ter vergonha de gostar tanto de futebol. A mesma repugnância que tenho quando lembro a forma com que as vítimas da tragédia foram tratadas antes e depois do incêndio pela diretoria do Flamengo. A mesma que se vangloria de gastar aos tubos em um elenco milionário enquanto pechincha na Justiça os custos de indenizações devidas pelas jovens vidas perdidas no desastre.